<< voltar
 
 
Recordações  


Ilona Peuker - Grupo Unido de Ginastas - Recordações

À mestra com carinho...

Aos doze anos de idade eu fazia ginástica feminina moderna (nome da ginástica rítmica à época) no clube Militar da Lagoa, no Rio de Janeiro, quando minha professora Martha Helga comunicou: - no próximo sába teremos uma demonstração do Grupo Unido de Ginastas (GUG) aqui no clube! Não conhecia o tal grupo, mas a professora garantiu que eu ia adorar! Ignorante e fanática pela ginástica, cheguei cedo ao ginásio da Lagoa para escolher um bom lugar. As lindas moças entraram, se apresentaram e me encantaram... Em seguida, eu indaguei: Martha, como é que eu faço para ter aula com essa tal Dona Ilona?

Na semana seguinte, acompanhada de uma colega de ginástica do clube Militar, apareci no clube Sírio Libanês, na rua Marquês de Olinda, em Botafogo (hoje não mais existe), pontualmente às 15 horas para uma aula de iniciantes. Fiz minha matrícula com Dona Nádia, sua fiel colaboradora, paguei um mês, coloquei minha malha e fui...

De início estranhei que Dona Ilona desse aula sentada no piano e vestida de saia e blusa. Pensei: - eu hem, que coisa estranha, ela não faz um exercício! Nos orienta do piano, de onde acompanha os movimentos com uma música super estranha... E fomos dando sequência à aula que me pareceu tranquila, não fosse a minha dificuldade em entender o português falado pela professora e pelos gritos tremendos que ela dirigia a mim e a minha colega. Eram tantos berros e tamanha a sua fúria que minha garganta começou a se fechar e com dificuldade contive o choro. Eu não atinava no por quê de tais gritos nem o que eu deveria estar fazendo de errado, pois os exercícios não eram assim tão complicados, a maioria deles eu já conhecia das aulas do clube Militar. Meu pavor culminou quando a professora deu com o pé no teclado do piano diante de um exercício com bola que eu executei. Levantou-se do piano, agigantou-se diante de mim e bradou: - o que este mulher faz com perna esta? Não entendi a pergunta, mas saí do ginásio correndo, enaquanto ela voltava para o piano, e me dirigi ao vestiário, onde não mais contive o choro... Ali encontrei uma componente do GUG que me perguntou: - o que aconteceu, por que você está chorando? E eu respondi: - ela gritou comigo a aula toda, é uma louca, não volto mais aqui... A veterana ginasta ainda teve tempo de me dizer: - então você deve ser muito boa ginasta e ter um grande potencial, pois ela só se altera com quem a surpreende... caso contrário, continuou, ela diz: que "bonicinha", com um sorriso amarelo mal disfarçado...

Sumi. Não voltei para a próxima aula, nem para a seguinte, até que pensei: já sei que não vou continuar mesmo a fazer aulas com essa senhora, não gostei de seu jeito, mas vou acabar as aulas deste mês. Voltei para a aula com a convicção de que ela podia gritar o quanto quisesse que eu não ia me abalar! A aula transcorreu às mil maravilhas, ela segurou a onda e eu também.

Assim era Dona Ilona: rígida, exigente e compreensiva.

Passei da aula das três para a aula das quatro, da aula das quatro para a aula das cinco; de seu grupo mais fraco para o mais forte - finalmente entrei pro GUG! Foram lindos anos disfrutando e colaborando com seu trabalho até o último dia de suas atividades com a ginástica.

Tudo o que aprendi e desenvolvi ali trago até hoje dentro de mim. Cresci muito com ela, aprendi a ter disciplina, método e responsabilidade; a soltar a emoção e a agir com racionalidade. Dona Ilona tinha o dom de aproveitar e de desenvolver em cada uma de nós o máximo de nossa criatividade, conseguia naturalmente despertar o melhor em nós mesmas e de fazer sentirmos ótimas!

Heloisa Frossard

(Heloisa Frossard é historiadora e foi aluna de Dona Ilona de 1970 a 1975.)

<< voltar