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Recordações  


Ilona Peuker - Grupo Unido de Ginastas - Recordações


II Gymnaestrada, Zagreb, Iugoslávia, julho e agosto de 1957.

Diário de Ingeborg Müller, ginasta da seleção brasileira na II Gymnaestrada, em Zagreb,
primeira viagem internacional da ginástica rímica brasileira.

Já em 1956, o GRUPO UNIDO DE GINASTAS havia recebido um convite para participar de uma competição de ginástica que se realizaria em Graz, na Áustria, mas apesar de todos os esforços, como falar com o Sr. Juscelino Kubitschek, ir à Câmara dos Deputados, falar com o Deputado Geraldo Starling Soares, e outras peripécias mais, nada conseguimos. Tentamos até o último momento e já estávamos às vésperas da competição e nada conseguíramos. Afinal nos demos por vencidas, cansadas e tristes depois de tanta luta.

Em 1957, novo convite foi feito, mas, desta vez, para participarmos da II Gymnaestrada que aconteceria de 10 a 14 de julho em Zagreb, na Iugoslávia. O que nos ajudou muito foi o fato do Ministério de Educação ter recebido igual convite, mas ainda assim tivemos um grande trabalho para convencer as autoridades de que deveriam nos apoiar.

Depois de correr meio Rio de Janeiro e de mais uma vez tentar falar com o Sr. Presidente da República, de fazer ala para o Presidente de Portugal, Sr. Craveiro Lopes e de muita conversa com o Ministro da Educação, tudo levava a crer que desta vez iríamos conseguir. Já estávamos bem animadas quando, quatro dias antes da viagem recebemos a triste notícia de que tudo tinha ido por água abaixo. Ficamos arrasadas, tanto esforço em vão.

Qual não foi nossa surpresa quando, faltando apenas dois dias para a data prevista para o embarque, recebemos a notícia de que afinal iríamos, sim! Dali, até o momento da partida, o tempo passou como uma corrida vertiginosa, uma vez que ainda havia muita coisa a fazer como conseguir os vistos para os passaportes, fazer compras urgentes e outros detalhes de última hora que uma viagem acarreta. Mas, tudo era alegria, pois, enfim, íamos representar o Brasil na Gymnaestrada e conhecer um pouco da velha Europa.


4 E 5 DE JULHO DE 1957

Depois de muita confusão, poses para fotógrafos, e animadas despedidas, embarcamos no Constellation PDE, da Panair do Brasil. Devido à alfândega, saímos com meia hora de atraso, portanto às 22h30. Éramos ao todo 18 pessoas: Dona Ilona, nossa técnica; Fernanda Beltrão, observadora; Guiomar Becker, de Belo Horizonte, observadora; Stella Guérios, de São Paulo, observadora; Luiza, nossa pianista; Chiquita e o marido Roberto, Sônia e o marido Celso, Ingrid, Lia, Gunni, Judit, Anita, Mary, Graça e eu, Inge. Acomodamo-nos da melhor maneira possível, e nos preparamos para enfrentar as longas horas de vôo. Sentei-me com a Ingrid. Após os letreiros de “não fumar” e “colocar cintos” se apagarem, trocamos de roupa, tirando o vestido do uniforme e colocando calças compridas para ficar mais à vontade durante o vôo. Pouco tempo depois, a luz do avião se apagou e, apesar da ansiedade, fomos obrigadas a dormir. Apesar de todo o cansaço não consegui cochilar, o pensamento de que estávamos voando para a Europa para representar o Brasil era suficiente para me manter mais do que acordada. Sem alternativa, fiquei olhando a Lua que, infelizmente, naquela noite não estava muito bonita.

Aterrissamos em Recife sob forte chuva às 3h20, como a primeira escala do vôo. No aeroporto nos serviram um pequeno lanche: biscoitos, abacaxi e outras coisinhas. Estava apenas fresca a noite pernambucana, mas a excitação fazia com que eu tremesse mais do que o necessário. Eram 4h30 quando o alto-falante anunciou o novo embarque. Enquanto nos encaminhávamos para o avião, os pensamentos que me vinham à cabeça não eram lá os mais confortáveis: dali em diante iríamos voar sobre o oceano por sete horas e meia, e se alguma coisa de desagradável acontecesse, eu teria que empregar todos os meus conhecimentos de natação; teria ainda que ficar prestando atenção, para saber sempre onde estávamos sobre o oceano, para então, em caso de emergência nadar para o lado que ficasse mais perto – o Brasil ou a África. Idéias sinistras de uma marinheira de primeira viagem transoceânica! Felizmente, toda essa aflição foi inútil, uma vez que tudo transcorreu maravilhosamente. Pouco depois de Recife, pudemos apreciar durante algum tempo o raiar do dia, desta vez o sono foi mais forte e adormeci.

Eram 7h da manhã, quando o “aeromoço”, aos berros, nos desejou um bom dia, como se depois de tais urros ainda pudéssemos passar um dia tranqüilo. Com os rostos inchados de cansaço, fomos ao toalete a fim de melhorar um pouco que fosse a nossa aparência. O café que nos serviram estava uma delícia, mas também se não estivesse, pouca diferença faria, já que fome era muito grande. Lá fora, o dia estava claro e ensolarado, mas só víamos céu e mar. As horas transcorreram animadamente no meio de brincadeiras e batucadas, com os instrumentos que estávamos levando para esse fim.

Quando avistei terra, senti uma alegre emoção em pensar que aquilo era a África que eu havia visto tantas vezes no mapa. A terra era seca e árida, predominando a vegetação rasteira. Quando pousamos em Dakar como uma segunda escala, às 3h da tarde e o impacto do vento quente quando saímos do avião foi bastante desagradável. A primeira coisa que fizemos foi tirar fotografias e tivemos muita sorte, pois apareceram negros vestidos com suas roupas típicas e que concordaram, depois de chamados, em posar para nossas fotos. Sempre brincando, dizíamos que aqueles eram os avós do Celso e que tinham ido ao aeroporto para esperá-lo.

Num restaurante bastante grande nos ofereceram um almoço constituído principalmente de frios que dizíamos, na brincadeira, deviam ser orelhas de elefante ou então bife de rinoceronte. Coca-cola tinha outro nome na África, e esse tal nome era escrito de maneira muito esquisita e, continuando a gozação, achamos que não devia ser um nome muito bonito.

Embarcamos novamente às 4 h e depois de mais sete horas de vôo, chegamos a Lisboa. Hora local: meia-noite, apesar do adiantado da hora, entramos no aeroporto, animadas, cantando o hino do Grupo e loucas por um caldo verde. Foi-nos servido um lanche com doces deliciosos e a impressão que tive de Portugal foi a melhor possível. Compramos ainda alguns cartões postais para que sempre nos lembrássemos da terra que nem chegamos a conhecer. Às 1h da manhã, fomos chamadas para o terneiro embarque e, algum tempo depois, decolávamos de Lisboa rumo a Madri.


6 DE JULHO DE 1957

Em Lisboa havia sido trocada a tripulação e, para grande alegria da Gunni, o comissário de bordo era o “marido da índia”, vizinha dela no Rio. Tínhamos também um outro personagem muito interessante a bordo. Era um senhor muito velhinho, a aeromoça era obrigada a ajudá-lo em quase tudo. Seu destino era Beirute e o pobre homem dizia tanta asneira, que achamos que ele devia ser “beiruta”!

Depois de pouco mais de uma hora de vôo, pousamos em Madri. terra das touradas e dos toureadores, que, certamente, àquela hora deviam estar dormindo. No aeroporto, para variar, recebemos um refresco de laranja que por sinal estava acérrimo. Eu me sentia péssima, com muito frio e terríveis tonturas devido ao vôo. Passado algum tempo, voltamos ao avião que pouco depois decolava, mais uma vez, agora, o destino era Roma.

Conseguimos dormir até as 6h30, quando fomos avisadas de que Roma se aproximava. Pousamos sem problemas. Infelizmente, perdemos mais de uma hora em uma enorme confusão para resolverem nossa conexão para Zurique. O avião que nos levaria para a Suíça somente sairia às 12h30, o que nos dava algum tempo para conhecer a cidade, mas antes teríamos que ir ao Centro, à agência da Swissair, acertar detalhes do próximo vôo. Depois de uma longa espera, embarcamos em um ônibus que nos levaria à cidade. No caminho passamos pela Via Ápia e vimos ruínas, o que nos deixou muito empolgadas. Após resolver os problemas na agência de viagem, ainda nos restavam duas horas para conhecer Roma correndo. Pegamos dois táxis e saímos, em vertiginosa corrida, pela Cidade Eterna.

O dia estava uma beleza e foi sob este efeito de luz que vimos as grandes obras. Primeiro fomos ao Coliseu onde tiramos muitas fotografias e de onde roubei uma pedrinha como lembrança. Em seguida, fomos jogar moedas na Fontana de Trevi, cuja cor verde da água nos encantou. Dali, seguimos para a Basílica de São Pedro, que com toda a sua majestade fazia com que sentíssemos a nossa enorme insignificância. A cúpula central, toda pintada, era de uma imponência sem par. Depois de apreciar tudo da melhor maneira possível saímos correndo novamente. A esta altura até o chofer do táxi já corria para abrir as portas do carro quando chegávamos. Continuando nossa maratona, visitamos a Escada Santa, a igreja Sta.Maria Maggiore, a igreja São João do Latrão, o Fórum Romano a estátua de Vitor Emmanuel II, olhando tudo mais que aparecia em nosso caminho. Quando o tempo se esgotou, retornamos à agência de viagem, antes, contudo, fizemos algumas compras nas imediações: cartões postais, óculos escuros etc. Chegada a hora, embarcamos novamente no ônibus que nos levou de volta ao aeroporto.

O avião da Swissair era um Convair 440 novinho, e a aeromoça usava um uniforme bem diferente do usado no Brasil, pois em cima do vestido azul ela levava um avental, encarnando o tipo perfeito da dona de casa suíça. Sobrevoamos Milão e Florença, mas em virtude da grande altitude não conseguimos ver nada de especial. O almoço foi servido ao som de música que tocava em surdina e foi muito bem recebido por todos. Mas nem todos do grupo estavam a bordo daquele avião, pois por falta de lugares tiveram que ficar para o vôo seguinte. Minutos depois sobrevoávamos os Alpes e a sensação de estar vendo neve pela primeira vez na vida foi incrível. A Gunni aproveitou para tirar algumas fotografias. Quando a neve deixou de ser novidade, pegamos os nossos instrumentos e começamos a cantar e batucar, ao que um passageiro, espírito de porco, naturalmente, reclamou dizendo que o barulho do avião já era mais do que suficiente, mas isso em nada interferiu sobre nossa alegria.

Chegamos a Zurique e a primeira providência foi tomar um banho no próprio aeroporto, pelo que pagamos um schilling. Nunca imaginei que se pudesse tomar banho no aeroporto, mas foi uma maravilha depois de toda aquela viagem. Nos aeroportos da Europa até isso é possível, pois as instalações são ótimas, muito asseadas e as toalhas que recebemos estavam impecavelmente limpas.

Resolvida a questão da alfândega, fomos levadas para um ônibus espetacular, cuja capota era toda de vidro, permitindo ver tudo e mais alguma coisa. A paisagem era maravilhosa: campos muito verdes, cobertos de pequenas e coloridas flores, que em contraste com o céu muito azul e as montanhas cobertas de neve que se podia ver ao longe, formavam um lindo cartão postal. A natureza de tão limpa, fez-nos chegar à conclusão de que na Suíça mesmo a sujeira não podia ser suja. Entrando na cidade, travamos conhecimento com as casas típicas cujas janelas eram, infalivelmente, enfeitadas com vasos de flores.

Chegando ao centro, fomos novamente deixadas em uma agência da Swissair, onde por incrível que pareça, permanecemos durante quase quatro horas. Estávamos exaustas e para espantar o sono fomos passear no mercado próximo, onde comemos um delicioso sorvete. Mas o que mais gostávamos mesmo de fazer, era passar por uma porta, na saída da agência, que se abria automaticamente cada vez que alguém se aproximava dela. Então, um brinquedo novo para nós! Depois de muito tempo fomos para um hotel que ficava próximo à estação do trem. No hotel Simplon, aliás, muito bom, fiquei no quarto com a Gunni. Como ainda faltasse algum tempo para o jantar, resolvemos dar um passeio por perto e as lojas que vimos nos deixaram alucinadas. Felizmente era sábado, e assim nada pudemos comprar. O jantar no hotel estava uma delícia e foi devidamente apreciado, mas o que mais nos encantou foi o porteiro do hotel, que era uma belezinha, e ao qual só nos referíamos como “o pão do porteiro”, mas ele só nos olhava de cara feia. Devia estar com fome!

Quando fomos nos deitar, já estávamos mais mortas do que vivas, o enorme calor nos parecia ainda pior no quarto que ficava no último andar e que quase não nos deixou dormir. Virávamos de um lado para outro na cama enquanto as últimas impressões da viagem passavam diante de nossos olhos como se fosse um filme. Só depois de muito tempo, conseguimos adormecer.


7 DE JULHO DE 1957


Depois de uma noite muito mal dormida, nos levantamos ainda muito cansadas. O trem para Zagreb devia sair às 7h e pouco, mas ficamos tranqüilas por saber que a estação ficava pertinho do hotel. Quando já eram quase 7 horas, nos demos conta de que a estação não era aquela perto do hotel e sim uma outra, que ficava bem mais longe. O hotel foi pago às pressas, em meio a grande nervosismo e confusão. Graças aos taxistas, chegamos em tempo, mas como as passagens ainda tinham que ser compradas, a corrida continuou. Às 7h20, mais ou menos, o trem entrava na estação e pouco depois embarcávamos afobadas. Todos não, pois quando o trem já começara a se movimentar, vimos Dona Yesis Passarinho correndo ainda do lado de fora, mas já era muito tarde. Aí sim, foi um Deus nos acuda!

Gunni descobriu que a sua frasqueira ficara com Dona Yesis e nela se encontravam todos os seus documentos, enquanto que a frasqueira de Dona Yesis estava com a Gunni. O problema aconteceu porque as frasqueiras eram iguais. As lágrimas correram em profusão e o desespero era desolador. Após muita discussão, Fernanda, Gunni e Stella resolveram saltar na estação seguinte, a fim de voltar para Zurique, uma vez que com os documentos trocados, certamente, a duas não iriam muito longe.

Dali por diante a viagem transcorreu relativamente bem, apesar do calor sufocante e da poeira. Em determinada estação ficamos paradas durante muito tempo, esperando uns vagões que iriam ser engatados no nosso trem, e como só tínhamos uma cabine, ficamos sentadas como sardinhas em lata. Bem mais tarde, ouvimos tocar o sino que anunciava o almoço e como estávamos esfomeadas achamos a comida bem gostosa. A esta altura, a paisagem que se descortinava das janelas era alguma coisa do outro mundo. Fiquei maravilhada com a cor verde dos pequenos riachos que podiam ser vistos ao longo da linha férrea. Não conseguia me cansar das montanhas, dos pinheiros de vários verdes diferentes, das igrejas com suas torres em forma de “cebola”, enfim de tudo aquilo que para mim era uma grande e maravilhosa novidade. Assim, fiquei praticamente o dia todo na janela do trem, apreciando aquelas belezas.

Estava prevista uma baldeação na pequena cidade de Schwarzach, no Tirol, e pedimos ao chefe de trem que nos avisasse quando chegasse o lugar. Lá pelas tantas, paramos numa pequena estação e eu achei, pela hora, que devia ser aquele o lugar. Já estávamos paradas há um bom tempo, quando o chefe de trem veio correndo para nos avisar que deveríamos saltar ali, pois aquele era o local de nossa baldeação. Nossa bagagem era enorme, por isto fora colocada no último vagão e encontrava-se na mais incrível confusão. Malas, sacolas, arcos, bolas, tudo amontoado. Quando soubemos que deveríamos ficar ali houve, mais uma vez, uma corrida desenfreada, pois Chiquita e Sônia estavam completamente à vontade, isto é, sem sapatos, com a blusa para fora da calça e agora tínhamos que sair o mais depressa possível. O tempo foi a conta exata, nem bem tínhamos tirado a última mala e já o trem recomeçava a sua marcha. Ufa! Pronto, lá estávamos nós com toda a bagagem à espera do trem seguinte e assim ficamos durante duas horas, nas quais fizemos de tudo para que o tempo passasse mais depressa. Numa pequena lojinha compramos escudos (emblemas) e depois fomos tocar nossos instrumentos, ao som dos quais várias pessoas que estavam por perto se aproximaram, inclusive um bêbedo que começou a abraçar a Mary, obrigando-nos a parar de tocar.

Pouco depois, chegava um outro trem e foi enorme a alegria de todos quando vimos que nele vinham Dona Yesis, Fernanda, Stella e Gunni, completando assim o grupo novamente. A Gunni de tão emocionada chorou furiosamente. Eram mais ou menos 17h.

Decorridas duas horas apareceu, graças a Deus, o trem que nos levaria a Zagreb. Estava atrasado em virtude de um descarrilamento e completamente lotado! Achamos apenas alguns lugares, e como éramos muitas, fazíamos um rodízio de tempos em tempos. Mais tarde encontramos uma cabine de 1ª classe e lá nos alojamos confortavelmente e contentes da vida.

Mal sabíamos o que nos esperava!


8 DE JULHO DE 1957

O sono vencera... Dentro da cabine estávamos dormindo umas com as cabeças encostadas nos ombros das outras, pernas nos colos das colegas e assim por diante. Devia ser, mais ou menos, uma hora da manhã, quando a porta do compartimento foi aberta ruidosamente e a luz acesa inesperadamente. Sonolentas, não sabíamos o que estava acontecendo, tínhamos chegado à fronteira da Iugoslávia e aqueles ruidosos senhores pertenciam à alfândega iugoslava que vinha verificar se não levávamos nada proibido. Nossos passaportes foram visados por um homem horrível, de cara muito zangada, e eu tive a sensação de que aquela devia ser a cara do comunismo. O que senti foi muito ruim. Tivemos que preencher um formulário e fazer uma declaração do dinheiro e jóias que levávamos. É, chegáramos à cortina de ferro! Ao pedirem as nossas passagens verificaram que eram de 2a classe, e assim, sem qualquer consideração, fomos postas para fora da cabine. O corredor estava abarrotado de passageiros e foi ali que tivemos que nos alojar da melhor maneira possível, sentando em cima das malas. Era de madrugada, estávamos exaustas e sentíamos bastante o frio. Lá fora, a paisagem era desoladora, cinzenta e coberta de neblina, que unidas ao nosso extremo cansaço me deu uma forte sensação de enjôo. A vontade que eu tinha era de chorar, mas isto não resolveria o problema. Assim, fomos até às 4 horas da madrugada quando, finalmente, chegamos a Zagreb.

Na estação tivemos a grata satisfação de ser recebidas por um rapaz de nome José, que falava muito bem português. Entregaram um ramo de flores à Dona Ilona e depois de reunida toda a bagagem, fomos levadas a um ônibus que nos deixaria no alojamento. A primeira impressão que tive da cidade foi a pior possível, pois era infestada por um cheiro que achei horrível e que eu não sabia a que atribuir.

Uma velhinha muito simpática recebeu-nos no alojamento e cuja maior preocupação, soubemos mais tarde, havia sido de como se comunicaria conosco, em que língua. Ao descobrir que seis de nós falavam alemão, idioma que ela, como grande parte da Croácia dominava, ficou felicíssima. Eram 5h da manhã e serviram-nos então um chá com rum e limão e pão com geléia de damasco. Quase vomitei quando tentei tomar aquele chá. Assim que terminamos fomos dormir. Tínhamos 3 quartos, sendo que no menor ficaram Dona Ilona, Dona Yesis, Fernanda, Stella e Dona Guiomar e nos outros dois o restante da turma. Apesar do cheiro que ainda me incomodava, do calor e da total claridade que entrava no quarto, dormimos pesadamente até o meio-dia.

Almoçamos às 13h30, mas apesar de toda a boa vontade da Omama - como chamávamos a velhinha que cuidava do alojamento - e da grande fome que sentíamos, a comida quase não foi tocada. Quiseram nos oferecer uma sopa consistente, mas a quantidade de gordura, pelo menos 1cm, que boiava em cima da sopa era quase repugnante e ninguém conseguiu comer. Saber depois que era gordura de carneiro por certo não despertou o nosso apetite.

Feita a digestão do muito pouco que comêramos, fomos treinar em um palco ao ar livre – Plaine Air – que ficava em um parque perto de casa, chamado Tuskanác. O treino foi péssimo e Lia se sentiu muito mal, chegando quase a desmaiar. Quando voltamos para casa, nos reunimos todas num quarto e Dona Yesis nos passou o maior carão em virtude de vários problemas, sem grande importância. Mais tarde veio um médico, por sinal muito bonito, que foi nos levar algumas vitaminas que deveríamos tomar durante as refeições. José traduziu a conversa e nós achamos muito engraçado quando ele disse: o senhor doutor está dizendo... Mais tarde, como a Lia ainda não houvesse melhorado, foi chamado um outro médico, que constatou ser a indisposição dela provocada, principalmente, pelo cansaço. O que mais estávamos estranhando era o forte calor e que conseguia ser pior do que nosso verão no Brasil. É que uma grande onde de calor assolava a região.

Em nosso alojamento estavam também os finlandeses e alguns egípcios e búlgaros e assim, terminado o jantar, Luiza foi para o piano e tocou um samba que botou todo mundo pra dançar. Os finlandeses adoraram nosso ritmo.

Fomos dormir relativamente cedo, pois o dia seguinte seria de muito trabalho.


9 DE JULHO DE 1957

Depois do café com geléia de damasco, as meninas resolveram sair, mas eu preferi ficar no alojamento juntamente com Mary e Judit, para escrever algumas cartas, pois o pessoal de casa já devia estar esperando notícias. Assim ficamos, as três, sentadas no refeitório até o almoço, escrevendo e conversando.

Às 13h tivemos um treino na Sala de Concertos e foi ali que ficamos conhecendo o “I’m sorry” – Slobodan. Ele era um dos encarregados do material, membro da organização e também atleta. Era bonito e simpático, e recebeu o apelido por ter pedido muitas desculpas por um buraco que havia no chão. O treino foi bem melhor do que o do dia anterior. Depois de terminado, Luiza ao piano e nós com nossos instrumentos improvisamos uma pequena batucada. Slobodan comentou que éramos muito animadas, bem ao contrário de outras equipes que eram muito mortas. Encantou-se por Lia, que também gostou muito dele. Tudo bem, todas estávamos longe de casa!

Somente quando chegamos ao alojamento é que almoçamos. Antes de ir para o treino comêramos apenas tomate e pimentão, alimentos que não pesariam em nossos estômagos. Almoçamos, portanto, às 15h30, quando já deveríamos estar tomando o café da tarde. Satisfeitas, fomos assistir ao ensaio de 1.700 ginastas iugoslavos, no grande estádio, onde seria a abertura da Gymnaestrada. Parecíamos um bando de urubus, pois vestíamos uma calça preta em cima da roupa preta de ginástica e só nos diferenciávamos das simpáticas aves, porque levávamos ao peito o distintivo do CND. Bem, os urubus também são brasileiros.

Sem falsa modéstia, devo dizer que chamamos bastante atenção de todos, e pouco depois de nossa chegada a Ingrid já estava aprendendo algumas palavras em iugoslavo. Tivemos a sorte de encontrar o simpático médico e ele estava em companhia de um outro, igualmente ou mais simpático ainda. Era muito parecido com o JK quando sorria, mas infelizmente tinha um defeito na mão esquerda – uma enorme aliança. Conversamos bastante, misturando alemão com outras línguas. No treino geral da abertura apareceu também a tabuleta do Brasil, carregada por um rapaz que caminharia à nossa frente no dia do desfile, quando ele passou, aplaudimos freneticamente. Assim, pelo menos, todos ficaram sabendo de onde éramos, e o rapaz da tabuleta pôde nos dar um adeuzinho.

Mais tarde, depois do jantar, fizemos novas brincadeiras com nossos companheiros de alojamento, desfecho feliz para um ótimo dia!


10 DE JULHO DE 1957

Era ainda relativamente cedo quando levantamos, pois o desfile na praça principal estava marcado para as 10h.

Depois do café, vestimos nosso vestido azul com o distintivo do CND, que juntamente com os sapatos pretos faziam parte de nosso uniforme de rua. Ficamos durante muito tempo formadas numa rua vizinha à praça, pois como sempre acontece houve atrasos. Finalmente, entramos marchando garbosamente, de salto alto, na TRG Republique, onde nos posicionamos frente à nossa querida bandeira. Por ordem alfabética, foram tocados os hinos dos diversos países presentes e hasteada a bandeira correspondente. Quando a orquestra começou a tocar o nosso hino, aliás, muito lentamente, levamos a mão direita ao coração, como havíamos combinado. Dona Ilona, que não conhecia muito bem esse gesto e como não houvera um treinamento prévio, ficou procurando onde era o coração e colocou a mão em baixo do peito, o que foi motivo de muitas risadas depois. Apesar disso, a cena foi emocionante. Ouvir o nosso hino sendo tocado num país estranho, enquanto a bandeira ia subindo muito lentamente ao alto do mastro e saber que nós ali estávamos representando o Brasil, nos encheu de uma emoção indescritível e fez com que sentíssemos ainda um amor maior e orgulho da nossa terra.

À tarde, às 17h, houve novo desfile, mas desta vez no grande estádio Maximilian. O dia estava lindo e no céu azul se viam apenas algumas nuvens muito brancas. O gramado verde, as inúmeras bandeiras das mais variadas cores e que oscilavam graciosamente ao vento, formavam um quadro maravilhoso. Desfilamos pelo grande estádio com Lia à nossa frente carregando garbosamente a bandeira brasileira. O que mais me impressionou, foi o porta-bandeira russo que carregava a enorme bandeira vermelha transparente, com apenas um braço, estendido à frente.

Estávamos todas perfiladas quando, repentinamente, o tempo mudou, caindo logo em seguida uma forte chuva que nos deixou completamente molhadas e tremendo de frio. Terminado o desfile, houve ainda várias demonstrações dos iugoslavos, russos, tchecos e da Marinha de Belgrado. Anita, Judit e eu resolvemos ir para casa antes de terminada a apresentação, porque estávamos muito encharcadas.

Como não conseguíssemos condução alguma, fomos andando a pé durante um bom tempo, de túnica molhada e ainda carregando a bandeira, até que finalmente conseguimos um táxi.

À noite ficamos em casa.


11 DE JULHO DE 1957

Nossa primeira demonstração, que seria no Plaine Air, estava marcada para aquela manhã, como chovia muito, foi transferida para a Sala de Concertos. Enquanto, nervosamente esperávamos a nossa vez, repassávamos, atrás do palco, as diversas séries a título de aquecimento. Quem mais fazia exercícios era a Sônia, que não parava de fazer a “Dinâmica”, e com que entusiasmo! Além disso, comíamos açúcar de uva para adquirir maior força e resistência e eu, achando que quanto mais melhor, enchi tanto a boca que depois não havia saliva que molhasse tanta glicose. Fui obrigada, assim, a devolver tudo, desperdiçando tão salutar fonte de energia.

Aquele era nosso primeiro contato com o público local e como tal estávamos bastante nervosas, sem saber como seria recebida a nossa ginástica por uma platéia tão exigente, tão acostumada a ver trabalhos de ponta. Não havia perigo de vexame, isto a gente sabia, porque nossa técnica era a mundialmente famosa Ilona Peuker, o que nos deixava mais tranqüilas. Chegada a hora, entramos no palco por ordem de altura, com Lia à frente carregando a bandeira e com Luiza ao piano tocando “Qual Cisne Branco”. Durante a demonstração, quem segurou a bandeira foi Dona Ilona, que de brasileira tinha muito pouco. Nosso primeiro número foi a “Dinâmica”, depois “Duas Bolas” e para terminar o “Coco”. O público, para grande alegria nossa, aplaudia freneticamente e depois, quando marchando deixamos o palco, as palmas acompanharam o ritmo da música. Estávamos eufóricas por tudo ter corrido tão bem e, principalmente, pelo grande sucesso que alcançáramos!

Na saída da Sala de Concertos fomos cercada por muita gente que queria autógrafos. Cada uma de nós, rodeada por uma pequena multidão, assinava seu nome nos programas, em cadernos ou qualquer outro papel. Havia gente que, de tão organizada tinha, para cada país, uma página específica. Foi somente depois de algum tempo que conseguimos ir embora, literalmente flutuando de felicidade.

À tarde deitamos, pois estávamos bastante cansadas, mas às 7h da noite já fazíamos nova demonstração, repetindo o sucesso da anterior, situação a qual já estávamos nos acostumando.

Depois do jantar fomos a um baile no Hotel Esplanada, onde apresentamos nosso número de folclore. O salão estava abarrotado e, como não houvesse um palco, as apresentações eram feitas no meio do salão, em um pequeno espaço aberto no meio da multidão. Quando começamos a cantar a “Aquarela do Brasil” uns ingleses, resolveram cantar também, mas Gunni e eu tivemos que lhes pedir que ficassem quietos, pois quase não conseguíamos ouvir o piano da Luiza. Naturalmente, o número agradou e quando a Lia dançou mexendo os ombros, a rapaziada vibrou! Usávamos blusas brancas de babados e uma saia vermelha de “pois” brancos e dançamos com peneiras e coquinhos.

Mais tarde, terminadas as demonstrações, ficamos com os finlandeses e com o Slobodan. Tive a sorte de ganhar de um fotógrafo, uma fotografia da nossa demonstração tirada na Sala de Concertos.

Acho desnecessário dizer que chegamos em casa mais mortas do que vivas, aliás com razão, pois o dia fora repleto de atividades e de grandes emoções.

12 DE JULHO DE 1957

Na parte da manhã, tivemos nova demonstração na Sala de Concertos, na qual repetimos o sucesso do dia anterior, repetiu-se também a distribuição de autógrafos na saída. O que nos deixou muito contentes e curiosas foi saber que o Professor Rudolf Bode assistira a nossa ginástica. Ele foi um dos professores de Dona Ilona e gostou muito do nosso trabalho, ficando de ir ao nosso alojamento mais tarde para nos dar uma pequena aula. Era uma grande honra para nós.

Antes do almoço, pusemos nossa roupa do folclore, pois íamos ser filmadas naqueles trajes andando pelas ruas de Zagreb. Tudo correu muito bem, mas nunca chegamos a ver o filme. A lembrança que guardamos foram fotos que tiramos na ocasião.

À tarde, como ficara combinado, Professor Bode nos deu uma aula, o que para nós, professoras, foi muito interessante. Ele levou duas assistentes, uma das quais era maravilhosa na execução dos movimentos. Mais tarde, quando terminamos, Ingrid fez um pequeno discurso e entregamos um ramo de flores a Srª Bode e a ele uma flâmula como lembrança.

Depois do jantar, fomos assistir à demonstração dos húngaros, poloneses, iugoslavos e ingleses, que nos agradou apenas em parte. Na saída Lia, Judit e eu ficamos conversando com uns rapazes e dando alguns autógrafos, quando reparamos, nos havíamos perdido do resto do grupo. Como sabíamos o caminho para casa, pouco nos incomodamos. Um dos rapazes insistiu em nos acompanhar e por mais que agradecêssemos, não houve meio de nos livrarmos daquela coisa. Já no bonde, constatamos apavoradas que o cara continuava nos seguindo e estávamos começando a ficar com medo, pois tínhamos que subir ainda uma rua enorme e aquele sujeito continuava atrás de nós. Quando saltamos do bonde, já dispostas a correr ladeira acima, encontramos, como por milagre, o Zezinho. Nunca nosso intérprete foi tão bem-vindo! Por seu intermédio soubemos que Chiquita, Roberto, Sônia e mais alguns estavam tomando um aperitivo ali perto. Zezinho nos levou até lá e onde ficamos algum tempo rindo e brincando.

13 DE JULHO DE 1957

De manhã, a pior coisa para mim, era lavar o rosto e escovar os dentes, pois o cheiro da água, absolutamente insuportável, me causava náuseas, mas com sacrifício e algumas contrações estomacais, conseguia proceder à higiene necessária, mas isso, correndo ainda o risco de, a qualquer momento, encontrar um grego ou egípcio, que se serviam das mesmas pias que nós, no corredor em frente ao nosso quarto.

Naquele dia, depois do café, saímos para fazer algumas compras e passear um pouco. Tiramos várias fotografias do Zezinho, que nos acompanhava. No Centro, enquanto olhávamos algumas lojas, fomos abordadas por vários caçadores de autógrafos. Uma das meninas, depois de ter o meu nome no papel, insistia em me fazer uma pergunta em iugoslavo que eu, naturalmente, não conseguia entender, e assim, depois de algum tempo, ela desistiu. Repetindo, mais tarde, as palavras dela para o Zezinho, soube que ela perguntara qual era a pronuncia do meu nome. Coitada, ficou sem saber!

À tarde nos apresentamos pela terceira e última vez, desta vez no Plaine Air de Tuskanac. O nosso número que deveria ser o último foi antecipado, pois ia ser filmado e para tanto era preciso que ainda fosse dia claro. A câmera entrou em ação juntamente com os primeiros acordes da Luiza e só parou completamente quando deixamos o palco pela última vez. Esse filme também nunca foi visto por nós. Uma pena!

Terminado o jantar fomos ao Maximilian, onde assistimos demonstrações de grandes grupos: russos, tchecos e iugoslavos. Todos os números muito bonitos, mas o que mais me impressionou, principalmente no que se refere à parte de espetáculo, foi a apresentação dos tchecos, que terminavam em vários círculos concêntricos e no meio dos quais se erguia uma pirâmide humana, que como apoteose final, desfraldava, lá no alto, a bandeira tcheca. As russas, com um trabalho bem interessante e uma técnica insuperável, apresentaram números de bastões, dos quais saíam, no decorrer dos exercícios, pequenas bandeiras.

Quando chegamos em casa já era bem tarde e o nosso único desejo era deitar em uma boa cama!

14 DE JULHO DE 1957

Quando a equipe do Dínamo de Zagreb esteve no Rio de Janeiro, Ingrid e Gunni, já pensando em nossa viagem à Iugoslávia, foram procurar os jogadores, a fim de fazer contatos e saber algo sobre a terra deles. E foi assim, que naquela manhã, fizemos um maravilhoso passeio com o médico da seleção, Dr. Boubani, por vários pontos turísticos. Fomos somente nós três, já que o carro era pequeno e não comportava mais gente. Passeamos por lindas florestas e chegamos a um lugar onde se situava uma clínica de repouso e um bonito restaurante, no alto de um morro. Ali, tomamos café turco enquanto ouvíamos a Suite Peer Gynt de Grieg. Mais tarde, subimos numa espécie de caixa d’água de onde tiramos diversas fotos. Como lembrança, levamos também alguns galhos de pinheiros muito cheirosos.

De tarde realizou-se o desfile de encerramento no grande Estádio Maximiliam, com todas as equipes participantes da Gymnaestrada. Para fechar com chave de ouro essa grande festa esportiva, houve à noite, um baile, no qual ficamos com os finlandeses. Dançava-se numa grande varanda, de onde se via a lua quase cheia. Mexemos muito com a Mary, dizendo que ela tinha visto a lua em finlandês, pois lua naquela língua é igual a pescoço em francês.

Como eu estava muito cansada e não sendo uma ‘pé de valsa’, voltei para casa mais cedo, juntamente com Dona Ilona, Dona Yesis e Fernanda.

15 DE JULHO DE 1957

Acordamos muito cedo, pois nosso embarque para a Áustria estava previsto para as 6h30 da madrugada. O Zezinho e outro senhor nos levaram à estação e na hora marcada, entre despedidas e agradecimentos, o trem começou a se mover. Pouco depois já nos afastávamos a grande velocidade daquela cidade que seria sempre uma agradável e emocionada lembrança para nós e na qual deixávamos, com toda certeza, uma boa impressão, tanto como ginastas, como brasileiras.

Depois de aproximadamente dez horas de viagem com bastante chuva, chegamos à velha Viena, nossa segunda grande etapa. Para a nossa querida Dona Ilona aquele era um momento muito especial, pois ela estava voltando, depois de muito tempo, ao país que era a sua segunda pátria.

Na estação fomos recebidas por um pequeno grupo de pessoas, amigos e ex-alunas de Dona Ilona, que ofereceram a cada uma de nós um pequeno ramo de lindas flores. Passado o primeiro momento de efusivos cumprimentos e complicadas apresentações, nos dirigimos aos carros que nos levariam ao nosso novo alojamento. Para grande alegria minha me foi entregue uma carta de papai, a primeira que eu recebia na Europa.

Chegamos a Bundessportverwaltung na Blattgasse, lugar em que ficaríamos alojadas, onde depois de subir vários lances de escada, entramos em nossos novos quartos, que nos encantaram devido à limpeza e ao conforto. Ingrid, Gunni e eu resolvemos ficar juntas, mas isto depois da costumeira corrida para a escolha do quarto e da cama.

Enquanto subíamos as escadas deparei, num dos patamares, com uma enorme fotografia de um homem que eu tinha certeza já ter visto antes. Logo em seguida me lembrei: ele era um conhecido artista dos cinemas alemão e austríaco, além de renomado campeão de ski – Toni Seiler.

Depois do excelente jantar, servido numa sala que primava pela limpeza, fomos dar um passeio pela cidade, apesar da forte chuva que caía e do frio. Tremíamos mais do que o necessário, não só em função do cansaço, como também pelo fato de que até aquele momento só sentíramos muito calor. Demos uma volta por uma bela praça, onde no meio de um lago pudemos apreciar as alegres e coloridas evoluções de águas dançantes. Ficamos também alucinadas com o comércio, isto é, com as vitrines, pois àquela hora já estava tudo fechado, mas ainda assim pudemos ver coisas deslumbrantes. Depois de andar algum tempo, o senhor que nos acompanhava levou-nos a uma confeitaria, onde saboreamos um delicioso café vienense e uma maravilhosa torta de chocolate. O retorno para casa foi feito de bonde, enquanto sentíamos mais do que nunca aquele frio cortante.

Pouco depois pulávamos para dentro de nossas gostosas caminhas, e o sono chegou sem grande esforço.

16 DE JULHO DE 1957

Já de manhã recomeçaria nosso trabalho e, para tanto, tivemos que sair cedo das tais confortáveis caminhas. À noite teríamos nossa primeira demonstração em solo austríaco e precisávamos treinar, mas o treino saiu péssimo, pois ainda estávamos muito cansadas. Foi Félix quem nos levou ao local do treino e depois nos trouxe de volta para casa. Depois do almoço descansamos e não poderia ser de outra maneira, mas o tempo para dormir foi muito pouco, pois ainda tínhamos que passar nossas roupas para a demonstração.

Jantamos muito cedo. Eram apenas 6h da tarde quando nos sentamos para comer e antes de ir ao local da apresentação ainda fomos fazer uma visita a Union, a entidade esportiva que estava nos recebendo.

A demonstração naquela noite foi um grande sucesso e o número de folclore foi bisado. Mais tarde fomos com um grupo a um restaurante que ficava no alto de um edifício e o que mais me impressionou, foi ter que pegar um elevador para chegar lá. No Rio ainda não havia restaurantes tão no alto. Presentes ao jantar estavam: Mary, Anita, Lia, Ingrid, Gunni, eu, Felix, Jesse, um senhor da Panair do Brasil e dois outros homens um dos quais se chamava Ernst.

Chegamos em casa mais uma vez contentes da vida com o sucesso alcançado pela nossa ginástica.

17 DE JULHO DE 1957

Pela manhã, às 9h, fomos apanhadas pelo Felix e pelo Jesse para um passeio pela cidade e arredores. Subimos uma linda estrada, deixando Viena lá em baixo e visitamos o Leopoldsberg. Lá de cima, onde havia uma linda igreja, pudemos apreciar toda a beleza e imponência da cidade, cortada pelo tão cantado Danúbio. Tiramos muitas fotografias. Em seguida fomos visitar o famoso castelo de Schoenbrunn, do tempo de Napoleão, uma deslumbrante construção cercada por grandes e floridos jardins. Ao fundo havia uma antiga fonte, toda trabalhada, muito linda. Enquanto passeávamos por toda aquela maravilha, fomos abordadas por um casal que nos perguntou se estivéramos na Ginastrada. Nos reconheceram, ou melhor, identificaram por causa da Mary, de quem se lembravam. Foram muitas as fotos que tiramos naquele antigo castelo.

Saindo de Schoenbrunn, Felix nos levou para tomar um delicioso sorvete, o que veio bem a calhar.

Após o almoço, fizemos nova visita a Union, onde encontramos o Felix, sempre ele, que nos mostrou todas as instalações. De lembrança recebemos um bonito cinzeiro com o distintivo daquela entidade.

Mais tarde fomos dar uma voltinha no comércio e fazer algumas compras, isto é, gastar o nosso dinheiro, se bem que com tantas coisas bonitas, que para nós eram todas novidades, não havia dinheiro que chegasse. Tivemos que nos controlar bastante.

Voltamos para casa de bonde e, como boas jécas-turistas, passamos do ponto onde deveríamos saltar.

À noite fomos a um ‘Heuriger’, tradicional festa na Áustria, ligada à colheita do vinho. Acontece em um tipo de taberna, geralmente no lado de fora, no jardim. Em mesas compridas sob as árvores comemos, bebemos e nos divertimos bastante. Acho até que a turma estava um pouco azulada.

18 DE JULHO DE 1957

Aproveitando aquela bonita manhã, fomos passear no “Prater”, parque de diversões mundialmente famoso que àquela hora, naturalmente, não estava funcionando. Mas o parque em si já é tão lindo, que só caminhar por ele já era uma distração muito grande. Quem nos levou foram Felix e Jesse que, durante a nossa estada em Viena, foram incansáveis, procurando nos mostrar o mais possível de sua antiga e encantadora cidade. Continuando com o nosso turismo, visitamos vários edifícios e monumentos históricos e até jogamos uma moeda na fonte, na esperança de que ela nos faça voltar à Áustria.

De tarde, mais uma vez o Felix se sacrificou por nós, nos levando para fazer compras, findas as quais, voltamos de táxi para casa.

À noite, retornamos ao parque, mas desta vez para nos divertirmos com todos aqueles brinquedos. Andamos na roda gigante, a primeira que é gigante mesmo, pois tem 66 metros de diâmetro, sendo que cada um de seus bondinhos é mais ou menos do tamanho do bonde do Pão de Açúcar. Quando em dado momento paramos lá em cima, pudemos ver toda Viena com suas milhares de luzinhas. São ao todo 15 bondes pendurados naquela espetacular roda, mas soubemos que haviam sido 30, que durante a guerra foram destruídos, e que agora vinham sendo recolocados lentamente. Deixando a roda, passeamos numa espécie de bicho da seda, que corria numa velocidade incrível, fazendo com que ríssemos às gargalhadas. Foi muito bom. Derrubamos ainda latas com bolas de pano e, como prêmio, ganhei uma bolinha de papel presa num pequeno elástico. Enfim, foi uma noite memorável, repleta de risos e de distrações.

19 DE JULHO DE 1957

A fim de que não perdêssemos a mania, Dona Ilona marcou um treino para aquela manhã, que foi muito confuso, porque Sonia andava meio adoentada. Tínhamos que repassar todos os exercícios para a demonstração que realizaríamos numa cidade vizinha. Ao meio-dia, depois de arrumarmos uma pequena trouxa, partimos com destino a Tulln. Fomos em diversos carros, e foi durante a viagem que ouvi pela primeira vez a música “Warum strahlen heut Nacht die Sterne so hell”, que mais tarde eu voltaria a ouvir ainda muitas vezes, trazendo-me sempre à lembrança aquela pequena viagem que, apesar da chuva, foi deliciosa. Chegando ao nosso destino, fomos levadas para a casa do Senhor Rudi Ziemmerer, antigo amigo de Dona Ilona. Era uma casa muito bonita, com um lindo jardim, onde mais tarde tiramos uma série de fotografias. A Senhora Ziemmerer e sua filha eram muito simpáticas e assim logo nos sentimos com se estivéssemos em nossas próprias casas. Depois do delicioso almoço, fizemos um pequeno passeio pela redondeza, chegando até às margens do Danúbio, que de certa maneira me decepcionou bastante. Eu esperava que fosse mais largo e muito mais azul. Nos explicaram mais tarde, que azul, como dizia a valsa de Strauss, ele só era quando visto pelos austríacos depois de alguns bons tragos. Isto explicava porque para nós, que estávamos em jejum alcoólico, ele era meio amarelado. Continuando nosso passeio, fomos dar numa linda ponte por cima da qual passava o trem. Infelizmente chovia, o que de certa maneira prejudicou um pouco a paisagem.

Mais tarde, apesar da moleza, tivemos um treino no salão em que se realizaria a demonstração. Quando terminamos fomos para casa para passar os uniformes que estavam bastante amarrotados. Dona Ilona para nos ver um pouco mais animadas durante a demonstração deu-nos umas pílulas estimulantes, que surtiram o efeito desejado, pois tudo correu da melhor maneira possível e o número de duas bolas foi até bisado. Também o folclore agradou em cheio e foi apresentado com uma animação incomum. Resumindo: sucesso completo!

Somente quando saímos de lá é que fomos jantar, mas como o cansaço, àquela hora, já estivesse se abatido sobre nós completamente, pouco depois íamos para casa, para usufruir um sono mais do que merecido.

20 DE JULHO DE 1957

O dia amanheceu frio e chuvoso, mas mesmo assim saímos para passear. Visitamos a casa de uns amigos do Senhor Ziemmerer, cujo jardim era famoso devido à enorme quantidade de flores. Levava e fama com razão, pois era um deslumbramento. Mais tarde andamos novamente pelas margens do Danúbio.

Às 11,30h chegaram o Felix e o Senhor. Schatzi, para nos levar para Krems, outro lugarejo escolhido para mais uma demonstração. Lá chegando, saltamos em frente a um antigo casarão muito cinzento, que durante a guerra havia sido um quartel russo e, diga-se de passagem, tinha todo o jeito de quartel. Apesar do aspecto sinistro da casa, o almoço foi uma delícia. Já alimentadas, fomos ver o local da apresentação, mas desta vez sem treino, para grande alegria nossa.

À tarde, de carro, fizemos um passeio pela Wachau até Melk, passando por lugares lindos, grandes plantações de damascos e antigos castelos. Tudo às margens do Danúbio. Paramos numa dessas plantações e colhemos damascos com as nossas próprias mãos. Estava uma delícia. Já em Melk, atravessamos o rio numa barcaça, que nos deixou do outro lado.

À noite, depois de um rápido mata-fome apresentamos, mais uma vez, a nossa ginástica com o já costumeiro sucesso. Terminada a função fomos a um restaurante onde comemos com grande apetite.

Quando já nos encontrávamos na saída, pensando em ir para casa, dois homens, conhecidos do pessoal de lá, convidaram a mim e à Lia para irmos a uma boate. Admiradas com o convite, para não dizer: apavoradas, dissemos que não poderíamos ir sem o consentimento de Dona Ilona. O homem não se deu por achado e foi falar com ela, conseguindo sua concordância. E assim, lá fomos nós duas e mais a Gunni, com os três mosqueteiros que atendiam pelos nomes de Pepe, Fritz (o mais velho) e Pedro. Nos divertimos bastante, dançando e conversando sobre os mais variados assuntos. Foram muito simpáticos. Quando chegamos em casa já era bem tarde, mas havíamos passado um ótimo dia e o cansaço valeu a pena.

21 DE JULHO DE 1957

Levantamos às 6,30h para tomar um café que todo mundo achou horrível. Em seguida, tiramos uma porção de fotografias no pátio daquele velho casarão, algumas das quais com o rapaz da boate – o Pêpe, que estava visivelmente interessado no Lia. Pouco mais tarde já fazíamos nossa viagem de volta para Viena, aonde chegamos às 10h30.

Almoçamos num pequeno restaurante que ficava nas proximidades de nosso alojamento, onde comemos muito bem e depois de saborear um sorvete maravilhoso voltamos para casa. À tarde saímos para passear com a Hilde, uma antiga aluna de Dona Ilona, muito simpática e que nos levou para uma linda praça no centro da cidade. Ali, em frente a uma estátua do Johann Strauss, tiramos várias fotografias: Hilde, Gunni, Lia e eu. Em seguida tomamos café ao ar livre, coisa, aliás, muito interessante. No meio do jardim estavam espalhadas várias mesas na quais era servido o café ou qualquer outra coisa que se quisesse tomar. No Rio eu nunca havia visto isto. As tortas e doces eram trazidos numa espécie de carrinho de chá e entre uma variedade enorme de doces, podia-se escolher o pedaço desejado. A escolha era uma das coisas mais difíceis, pois todos os doces eram maravilhosos e muitíssimo bem apresentados. Ficamos ali mais de uma hora tomando aquele café gostoso acompanhado de um pedaço de torta vienense. E, como se isto não fosse suficiente, ainda havia uma orquestra tocando lindas valsas, não muito longe dali. Foi uma tarde maravilhosa. Voltamos para casa de táxi, pois começara a chover.

Chegara a hora mais difícil da viagem – a despedida. Dali por diante, não mais viajaríamos juntas, pois naquela tarde, a parte oficial de nossa excursão, chegara ao fim. No dia seguinte, cada uma ia para um país diferente, de acordo com seus interesses e gostos. Muitas já partiriam naquele mesmo dia. Antes de nos separarmos, porém, ainda fizemos todas as contas, devolvendo o dinheiro emprestado. A Gunni chorou muito quando Dona Ilona, se despedindo, agradeceu o trabalho de todas e desejou, àquelas que ficariam ou que fossem para outros lugares, uma boa viagem e felicidades. Também eu tive que fazer força para não chorar, mas o nó que eu sentia na garganta era quase insuportável. Agora só voltaríamos a nos encontrar dali a vinte dias, em Zurique, e neste meio tempo cada uma faria uma coisa diferente.

Havia uma sensação de vazio, como se alguma coisa nos faltasse. Ficamos Lia, que no dia seguinte iria para a Alemanha comigo, Ingrid e Gunni. Foi assim que nós quatro saímos para jantar, no mesmo restaurante em que almoçáramos, ali pertinho de casa. Comemos muito bem e quando o dono daquela biboca soube que éramos estrangeiras, deu-nos o livro da casa para assinar. Desenhei um Pão de Açúcar, escrevendo por cima Rio de Janeiro, Brasil e em baixo os nossos nomes. Chegando em casa tratamos de arrumar nossas últimas coisas que ainda estavam espalhadas, porque no dia seguinte teríamos que sair cedinho das camas.

22 DE JULHO DE 1957

Levantamos às 5h30 e depois de vestidas e com as malas prontas descemos para tomar o nosso café, o último em Viena. Em seguida fomos para a estação e eram exatamente 7h30 quando o trem, apitando, deu o sinal de partida. Chovia fortemente e assim continuou pelo resto do dia.

Ali terminava mais uma etapa de nossa viagem, talvez a mais bonita. Viena deixava em mim uma impressão muito forte e eu disse para mim mesma: “se algum dia eu tiver que sair do Brasil, virei para a Áustria.”

13 DE AGOSTO DE 1957

Lia e eu estávamos em Paris - e eram 6h da madrugada quando levantamos naquele dia. Com tudo já arrumado descemos para tomar café e depois de pagar as nossas contas, embarcamos num táxi que nos levaria para a estação de trem. Já tínhamos dispensado o táxi, quando Lia notou que esquecera a máquina fotográfica dentro do carro. Era uma máquina novinha que ela havia comprado, a pedido de um cunhado, na Alemanha. Ficamos desnorteadas e eu fui então falar, em alemão (em francês era impossível!), com um senhor que se encontrava num balcão e que nos disse que a única coisa a fazer era depois entrar em contato, por carta, com a polícia de achados e perdidos, e deu-nos o endereço daquela entidade. Conversamos com ele e mais um outro senhor durante longo tempo, pois o trem, para sorte nossa, sairia mais tarde do que esperávamos. Prometi lhes mandar um cartão do Rio de Janeiro. Ás 8h30, deixávamos Paris. Não havia nada que pudéssemos fazer àquela hora para reaver a máquina. A viagem foi muito boa, como também a comida servida no carro restaurante. Em Basiléia, cidade fronteiriça, fizemos baldeação e tivemos que passar pela alfândega. Eu estava com um pouco de medo, pois a Lia levava muitos perfumes na frasqueira, mas felizmente só eu tive que abrir a mala. Tivemos que esperar pelo outro trem que sairia mais tarde e nossa maior preocupação era a bagagem que ficara com um carregador. Tínhamos medo de não encontrá-lo na hora do embarque, mas estávamos na Suíça e tudo correu bem. Já nos trem, um rapaz nos ajudou a colocar as malas no bagageiro, em cima. Mais tarde, perguntou que língua nós falávamos e ficou muito admirado quando dissemos que éramos brasileiras. Achou que o português soava muito bem e que eu falava muito bem o alemão.

Chegando em Zurique, cidade onde deveríamos nos reunir todas novamente, fomos diretamente para o hotel Simplon. Lá já encontramos grande parte da turma e a alegria do reencontro foi grande. Jantamos no restaurante Gruener Heinrich, onde nos divertimos bastante, pois todas tinham muita coisa para contar. Dali, nós resolvemos ir a um cabaré, onde assistimos um número de streap-tease. Estavam Sonia, Celso, Chiquita, Roberto, Graça, Lia, Gunni e seu irmão Helmut e eu. Durante o número de streap-tease, o Celso estava muito distraído, com sua mão no encosto da cadeira e a dançarina aproveitou aquela mão para encostar seu bum-bum durante a dança. Rimos muito da cara do Celso, que ficou bastante desconsertado. Vários rapazes estranhos vieram nos tirar para dançar, mas como não eram nada de excepcional, depois de algum tempo arranjávamos uma desculpa para voltar à mesa.

Na volta para casa fizemos uma farra enorme e nos divertimos a valer até depois da meia-noite.

14 DE AGOSTO DE 1957

Acordamos às 7h e depois de arrumar as malas saímos para comprar as últimas “goiabas” – como eram chamadas as compras pelos rapazes do Duque de Caxias. Vimos vitrines maravilhosas, mas muito caras também. Neste dia resolvemos fazer nosso almoço no quarto do hotel, pois estávamos quase todas na lona e assim compramos salsichas e pão e foi o que comemos.

Às 13h50 estávamos na Swissair, onde tivemos que apresentar nossas passagens e nossa bagagem, que foi devidamente pesada. Até nós tivemos que subir na balança com os volumes de mão. O resultado dessa pesagem foram nada menos do que 240 quilos de excesso. Como não tínhamos dinheiro para pagar esse excesso de peso, a companhia queria ficar com várias malas, mas depois de uma boa conversa, ficou resolvido que o pagamento seria feito no Brasil.

Fomos levadas ao aeroporto num ônibus enorme. Havia gente de todas as raças e tipos, incluindo árabes e indus em seus trajes típicos. Estávamos muito distraídas, aguardando o embarque, quando de repente ouvi o meu nome gritado no alto-falante: Ingeborg Müller, passageira da Panair do Brasil com destino ao Rio de Janeiro, queira se apresentar. Fiquei assustadíssima! O que poderia ser? Será que era eu mesma? Quando chamaram pela segunda vez, me dirigi ao lugar indicado e qual não foi a minha surpresa ao receber uma carta da Marília que fora mandada para Lueneburg e que tio Helmut mandara para Zurique.

Nosso avião decolou às 15h50 e no primeiro trecho da viagem pudemos apreciar o Mont Blanc e eu o vi melhor do que ninguém, pois estava sentada placidamente no reservado, que também tinha janela. Chegamos a Lisboa quando eram 20h30. Ali jantamos e eu comprei um broche de filigrana para a mamãe. Decolamos novamente quando os relógios locais marcavam 21h45. Eram 3h50, na África, quando, depois de uma ótima viagem, pousamos em Dakar no dia 15 de agosto. Mais uma vez nós decolamos, eram 4h30 da madrugada, para desta vez atravessar todo o Atlântico. Conseguimos dormir um pouco, mas depois que o dia clareou, voltamos à nossa atividade fazendo uma farra danada. Batizamos dois alemães e um italiano, na travessia do equador, jogando sal e água em suas cabeças.

Quando pisamos em terras brasileiras, os relógios marcavam 8h30 da manhã, mas antes, tomamos um verdadeiro banho de inseticida.

No último trecho de nossa viagem, tive oportunidade de conversar durante muito tempo com um rapaz de nome Pedro. Uma hora antes da chegada começamos a nos preparar: pintura, troca de roupa etc.

Foi grande a alegria de todos quando saltamos do avião. Papai me esperava junto à escada e tirou várias fotografias do desembarque. Os cumprimentos foram efusivos, mas antes de passar pela alfândega tivemos que posar para um jornal.

Depois, tudo aconteceu rapidamente: alfândega, polícia etc. e logo estávamos abraçando o pessoal que nos esperava lá fora.

Rio de Janeiro, última etapa desta viagem maravilhosa, que a princípio nos parecia praticamente impossível e que agora já ficara para trás – era passado! Tínhamos, porém muitas coisas para lembrar, contar, e isto, decerto, seria por bastante tempo. As recordações desmaiam, mas não desaparecem. Muito menos quando se tem um diário a que recorrer sempre que a memória falhar. Foi com este objetivo que escrevi tudo isto, para que esta viagem, que durou apenas seis semanas, me traga lindas e maravilhosas recordações para o resto da vida.

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